Evidência: O Programa da Saúde da Família é eficiente no AVC?

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Por Norberto Cabral e Gisele Sampaio

O acidente cerebrovascular (AVC), um dos maiores problemas de saúde pública mundial e primeira causa de óbito no Brasil, foi responsável em 2010 por 9% de todos os óbitos ocorridos no país (99.732/1.136.947). A evolução das taxas de incidência entre a década de 70 até os anos 2000 demonstra que a quantidade de novos casos em todo o mundo dobrou em países de baixa e média renda, e diminuiu 40% em países de alta renda. Estas diferenças são expressão da qualidade da prevenção seja pública ou privada.

No Brasil, onde 78% da população (150 milhões) usam o SUS, esta prevenção ocorre nos ambulatórios dos bairros. Ela é focada, principalmente, nas pessoas portadoras de hipertensão arterial, diabetes, tabagismo e colesterol elevado e visa, fundamentalmente, prevenir dois desfechos duros: AVC e infarto do miocárdio.

Desde 1994, existem no Brasil dois modelos principais de assistência ambulatorial pública: as unidades do Programa da Saúde da Família (PSF) e as unidades não-Saúde da Família, os chamados “postinhos” ou UBSs (Unidades Básicas de Saúde).

O PSF, visto como um programa ideal e sendo foco estratégico do Ministério da Saúde, realmente funciona? Quais as evidências de efetividade?  A pergunta é pertinente, até porque cada equipe custa 30% mais que o modelo usual.

Em um estudo com seis anos de seguimento, publicado em outubro de 2012, no American Journal of Public Health, Cabral e colaboradores da Universidade da Região de Joinville acompanharam 241 pacientes que sobreviveram ao primeiro AVC  ocorridos em 2005 e 2006, em hospitais públicos  de Joinville  (500 mil habitantes, dois terços usuários do SUS) e que voltaram para suas casas, continuando a prevenção secundária nos seus respectivos ambulatórios, comparando os dois tipos de tratamento preventivo (PSF vs não-PSF).

Conseguiram demonstrar que o modelo PSF é mais eficiente que o modelo convencional.  Entre os pacientes que foram pelo menos duas vezes ao ano ao seu posto, foram comparadas as taxas de um segundo AVC, a ocorrência de um infarto do miocárdio ou óbito ao longo de seis anos, entre 103 pacientes no grupo PSF e 138 pacientes não-PSF.

Em seis anos, 38% (39/103) dos pacientes que estiveram sob assistência das 35 unidades PSF de Joinville (que atendem 36% da população) faleceram. Entre os que tiveram assistência nas 21 unidades não-PSF,  54% (75/138) tinham falecido.  Foram consideradas variáveis como a influência da gravidade do primeiro AVC e grau de escolaridade.

Curva de sobrevida apos 6 anos do primeiro evento de AVC, dividido entre pacientes em tratamento no PSF e não PSF.

O estudo concluiu que a prevenção secundária e regular em unidades PSF reduziu em 16% o risco absoluto de óbitos ou, visto de outra forma, a cada sete pacientes tratados no modelo PSF, um óbito foi evitado. Embora não significativa, a diminuição da morbidade pode ser menor também entre nos pacientes do grupo PSF, pois 30% (31/103) tiveram um segundo AVC ou um infarto do miocárdio contra 36% (50/138) no grupo não PSF.

Modelo do PSF – Ministério da Saúde

No modelo do PSF, cada equipe atende por agendamento, entre 600 a 1000 famílias cadastradas, em uma equipe composta por clínico geral, um enfermeiro, quatro agentes de saúde e que recebem salários competitivos com o mercado. As unidades não-PSF, criadas antes do modelo PSF, não tem agentes de saúde e são compostas por clínicos, enfermeiros, ginecologistas e dentistas que atendem por demanda.

De um programa restrito a poucas regiões do país em 1994, o modelo PSF está em franca expansão nacional. Atualmente o PSF atende 100 milhões e está presente em 90% das cidades brasileiras. Popular, é comum se ouvir dos candidatos a prefeito que irão ampliar o número de unidades PSF.

O modelo PSF tem mais de 15 anos de existência. Já existiam evidências robustas de eficácia do PSF na redução da mortalidade infantil, e os resultados de Joinville, que precisam ser replicados em outras cidades, mostra também eficácia na mortalidade de pessoas adultas. Isto não é pouco, pois idade é um fator de risco mais potente que hipertensão arterial e o país irá envelhecer muito nas próximas décadas.

Obs. Texto adaptado da Newsletter NeuroAtual, Out/2012.


One thought on “Evidência: O Programa da Saúde da Família é eficiente no AVC?”

  1. Este artigo é maravilhoso. Mostra a importância do PSF e o quanto ainda podemos fazer para melhorar a saúde pública com um grande impacto na mortalidade. Parabéns Cabral

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