Vários estudos importantes na área de AVC foram apresentados no congresso europeu de AVC, o ESOC 2019, que aconteceu na semana passada em Milão, alguns deles com publicações concomitantes em revistas de impacto.
RESCUE BRAIN – French Multicenter Randomized Trial on Neuroprotection with Lower Limb Ischemic Per-Conditioning in the Acute Phase of Cerebral Infarction. Estudo francês que testou a insuflação e desinsuflação em valores pressóricos acima da pressão arterial, no membro inferior não afetado, até 6 horas do AVC, como tratamento para reduzir crescimento do volume do infarto cerebral, baseado em estudos positivos experimentais e em infarto do miocárdio. O desfecho primário foi uma mudança da área de infarto do baseline para 24 horas após o AVC, e o estudo foi negativo – ou “neutro”, forma agora “politicamente correta” para denominar estudos que não foram positivos…
PASTA – Paramedic Acute Stroke Treatment Assessment. Com um n de 1214 pacientes, o PASTA testou estratégia diferenciada da convencionalmente utilizada, de pre-notificação hospitalar pelas ambulâncias e equipe de paramédicos, como forma de incrementar a elegibilidade e o tratamento de pacientes com AVCi para trombólise endovenosa até 4,5 horas, em serviços ingleses. Também foi negativo, inclusive com leve tendência do grupo ativo (pacientes triados pelo grupo “PASTA-trained paramedics”) a ter menor percentual de pacientes trombolisados.
Taking Charge After Stroke (TaCAS): A randomised controlled trial of a person-centred, self-directed, rehabilitation intervention in community stroke survivors. Terapia de reabilitação baseada em auto-cuidado e auto-gerenciamento. Foi complexo para entender, mas as sessões de reabilitação eram “ensinadas” aos sobreviventes de AVC, mas de forma não direcional, e estes eram estimulados a persistir nas terapias e realizações de suas atividades de vida diárias, indo na sua “intuição” – posteriormente sendo medidos desfechos como qualidade de vida. O estudo testou 3 grupos de tratamento em 400 pacientes sobreviventes de AVC nas primeiras 16 semanas do icto: grupo submetido a uma sessão Take Charge; grupo com 2 sessões Take Charge e grupo controle (Stroke Foundation pamphlets). A terapia com uma ou duas sessões Take Charge foi superior em relação a escalas de qualidade de vida, independência e realização de AVDs. O protocolo detalhado das intervenções estão publicados AQUI.
THAWS: MRI-guided thrombolysis with alteplase at 0.6mg/kg for stroke with unknown time of onset. Estudo fase III que avaliou a dose menor de alteplase em pacientes com horário desconhecido do início dos sintomas, baseado em seleção por neuroimagem avançada. Infelizmente, teve de ser terminado precocemente, antes do n planejado de 300 pacientes, por causa dos resultados publicados do estudo WAKE-UP. O THAWS, randomizando um total de 131 casos, não mostrou diferença em desfecho clínico funcional em 3 meses, nem em eventos adversos de morte ou sangramento intracraniano.
RESTART – Restart or Stop Antithrombotics Randomised Trial. Incrível como não sabemos nada nessa vida. O que era a lógica do nosso pensamento – voltar a dar aspirina ou clopidogrel em pacientes com AVC hemorrágico aumenta o risco de novo AVCh – demonstrou-se exatamente… O contrário!!!! Foram avaliados 537 pacientes, sendo avaliados casos com e sem microblleds por ressonância, e comparando grupos onde o antiplaquetário foi reiniciado e o outro grupo, onde foi evitado. Não houve diferenças em recorrência de hemorragia intracraniana, entre os grupos com (2 ou mais lesões) e sem microbleeds (0 ou 1 lesão) – HR 0.30 (95% CI 0.08–1.13) vs 0.77 [0.13–4.61], com p=0.41. A recorrência de hemorragia intracraniana na população total do estudo foi de 4.5% vs 8.6%, para os grupos que reiniciaram vs que evitaram a reintrudução do antiplaquetário, ou seja, uma redução de risco de recorrência de 49% (HR 0.51). Publicação simultânea na Lancet.
RESILIENT – Randomization of Endovascular Treatment with Stent-Retriever and/or Thromboaspiration vs Best Medical Therapy in Acute Ischemic Stroke due to Large Vessel Occlusion Trial. Estudo brasileiro importantíssimo para a implantação da terapia de trombectomia em pacientes da rede pública brasileira e em outros países em desenvolvimento, ainda sem acesso a esta terapia. Avaliou a trombectomia até 8 horas do início dos sintomas (NIHSS ≥8 e ASPECTS ≥6) em pacientes com oclusão de grande artéria, versus tratamento médico convencional, tendo sido interrompido na primeira análise do DSMB (Data Safety Monitory Board), por eficácia comprovada no cenário testado. Foram incluídos 221 pacientes, tendo sido completados visitas de follow-up de 3 meses um total de 174 casos. A apresentação do RESILIENT, embora com resultados esperados, foi bastante aplaudida na sessão do ESOC 2019.
IMPACT-24B – Sphenopalatine Ganglion Stimulation Improves Outcome from Acute Ischemic Stroke in a Dose-Dependent Manner. Estimular o gânglio esfenopalatino, estimulando sistema nervoso parassimpático, que promove vasodilatação arterial, para aumentar o diâmetro vascular, melhorar o fluxo sanguíneo cerebral de colaterais e reduzir tamanho de infarto cerebral. Loucura loucura loucura! Mas funcionou em modelos animais e fase 2, no ImpACT-24A trial. Em Milão, Jeffrey Saver apresentou os resultados finais do 24B, sobre segurança e eficácia em análise de 1000 pacientes com AVCi de circulação anterior entre 8 e 24 horas. Para o desfecho primário, o estudo foi “neutro” – p=0.31. Porém, para os AVCis corticais, houve uma resposta clínica significativa (50% vs 40% – OR, 1.48; P = .025), com efeito de dose em curva U-invertida, e dose ótima entre estímulos baixos e médios, comparativamente às doses máximas e mínimas aplicadas. Publicação do trial ->> na The Lancet AQUI.