Malformação Arteriovenosa Cerebral: O que, e como tratar uma MAV cerebral?

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O que é uma MAV – Malformação arteriovenosa cerebral?

MAV é um emaranhado de vasos (artérias e veias) que pode se apresentar em qualquer lugar do corpo, e de forma relativamente bem conhecida no tecido cerebral. Quando a MAV está localizada em região fora do cérebro, se chama MAV periférica, e quando ocorre dentro da calota craniana, MAV cerebral. MAV cerebral é uma doença rara, ocorrendo em cerca de 1 a cada 100.000 pessoas, e acomentendo igualmente homens e mulheres.

 

O que acontece em uma MAV cerebral?

Em uma anatomia normal, as artérias se distribuem nos tecidos, e depois viram capilares (artérias bem fininhas), e depois destes capilares, as veas aparecem, se formam e drenam o sangue daquela região.

Esta organização “normal” e “anatômica” é construída na formação das artérias e veias do indivíduo, ainda na gestação. Nas MAVs, estas estruturas, estes vasos, se formam de forma anômala, “errada” no corpo, sem obedecer esta ordem de artéria-capilar-veia, tornando-se um enovelado confuso de vasos, e sem esta ordem natural do fluxo do sangue, ocorre uma circulação de sangue de forma “errada” na região comprometida, ocasionando  – na maioria dos casos – um aumento do fluxo local que, com o passar dos meses, e mais comumente anos e anos, podem alterar, e piorar a hemodinâmica e a anatomia das estruturas formadas de maneira anormal, sobretudo as veias, que são vasos fininhos e mais fracos, que usualmente não suportam a força do sangue bombeado das artérias.

 

Qual o perigo de uma MAV cerebral?

Muitas vezes, a MAV cerebral é descoberda em um exame de rotina, para pesquisar uma dor de cabeça, ou uma convulsão. Outras vezes, a pessoa não sente nada da MAV cerebral, e somente vai ter sintomas se ocorrer a ruptura, o sangramento intracraniano de uma MAV cerebral.

Portanto, o perigo principal da MAV cerebral é acontecer isso – o AVC hemorrágico, ou seja, a ruptura súbita de uma MAV cerebral, que pode levar a sintomas mai leves, ou ser fatal e incapacitante para o resto da vida da vítima/ pessoa acometida pela MAV cerebral. Alguns casos não tem ruptura, mas podem ter sintomas neurológicos devido ao roubo de fluxo de sangue de uma região para a região da MAV, ou sintomas neurológicos pelo crescimento da MAV, empurrando tecido cerebral normal, ao redor da lesão vascular.

 

Quais os sintomas de uma MAV cerebral?

Cerca de 12 a 15% das pessoas com MAV cerebral não sentem nada da lesão. Entretanto, sendo uma lesão congênita (a pessoanasce com a MAV), o risco de uma MAV romper e causar um AVC hemorrágico é grande, durante a vida da pessoa.

Os sintomas mais comuns são:

  • Crises epilépticas
  • Dor de cabeça
  • Fraqueza muscular em algum lado do corpo
  • Alteração de sensibilidade em um lado do corpo
  • Tontura persistente
  • Sintomas visuais
  • Alterações de raciocínio, de fala, de funções cognitivas

 

  • Qual o tratamento da MAV cerebral?

Esta é uma das questões bem controversas na literatura médica, principalmente se a MAV cerebral é descoberta ainda quando não houve sua ruptura. Tudo isso por causa do único estudo controlado sobre este assunto, o estudo ARUBA – A Randomized Trial of Unruptured Brain Arteriovenous Malformations, único estudo clínico prospectivo controlado até o momento a se estudar qual o melhor tratamento para MAVs chamadas assintomáticas (aquelas em que nunca houve um AVC).

 

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Em linhas gerais, existem 4 possibilidades e conduta médica diante de uma MAV:

  • Tratamento conservador – Significa apenas acompanhar, seguir clinicamente o paciente com MAV, fazendo exames seriados, para ver se a lesão aumenta, expande, e tratando com remédios os sintomas, se houver;
  • Tratamento cirúrgico – Envolve operar o cérebro, fazer uma neurocirurgia e retirar com bisturi, com esta cirurgia, a MAV. Para as MAVs pequenas em locais menos sintomáticos, com profissional treinado e habilitado, e para MAVs mais periféricas, é um dos tratamentos mais eficazes contra a doença;
  • Tratamento endovascular – Envolve realizar oclusão da MAV por via endovascular – neurorradiologia intervencionista;
  • Tratamento radiocirúrgico – Envolve submeter o tecido, a região da MAV cerebral, a uma carga de radioterapia, com a intenção de secar, murchar aquele enovelado de vasos.

 

Comentários sobre o estudo ARUBA

O ARUBA foi um estudo que teve financiamento público, do NINDS, agência de fomento de pesquisas americana. Não há, a meu ver, conflitos de interesse por nenhum tipo de tratamento que envolva procedimentos, próteses, materiais ou reservas de mercado de um ou outro especialista. O resultado do estudo, até o momento, foi a favor de tratamento clínico (expectante). Ou seja, é melhor não fazer nada com estes casos, e apenas acompanhar…

Vários centros de neurocirurgia vascular demonstraram e ainda alardeiam por aí severas críticas ao ARUBA, mas a verdade é uma só. Esta é a evidência científica mais forte, maus robusta, sobre qual é a terapia de primeira linha a ser escolhida, de uma forma geral, inicial, para as MAVs assintomáticas (que nunca sangraram)… Respeitadas particularidades de cada caso.

A partir destes novos dados, fica cada vez mais claro que em MAVs assintomáticas, a recomendação é seguimento clínico sem intervenções. E intervenções, sejam elas embolizar, radiocirurgia ou neurocirurgias, deverão ser feitas, a princípio, dentro de protocolos de pesquisa. Assim funciona a Medicina Baseada em Evidências. Não é achismo, anedotismo ou “eu faço, eu garanto, eu assumo”.

É buscar uma estimativa de melhor terapia médica, com base em estudos clínicos e estatística, para tentar aproximar o quanto podemos uma ciência que não é exata, a Medicina, em dados um pouco mais precisos…

Resta aos neurocirurgiões desenharem, fazerem, executarem, e logo!!! – um estudo clínico prospectivo, testando a hipótese que vários expertises em Neurocirurgia Vascular, em MAVs, conseguiram demonstrar / replicar, em séries de registro e estudos retrospectivos: de que as MAVs assintomáticas dos tipos I e II devem ser tratadas exclusivamente com Neurocirurgia.

Que venha o estudo BARBADOS e o TOBAS!!!

 

LINKS

Mohr et al. Medical management with or without interventional therapy for unruptured brain arteriovenous malformations (ARUBA): a multicentre, non-blinded, randomised trial. Lancet 2014. Estudo publicado em 2014.

Mohr JP et al. Viewpoints on the ARUBA Trial. AJNR 2014. Opinião e discussão dos autores do estudo sobre o mesmo e sobre as críticas dos neurocirurgiões.

Hanjani S. ARUBA Results Are Not Applicable to All Patients With Arteriovenous Malformation. Stroke 2014. 

Mohr JP. Results of ARUBA Are Applicable to Most Patients With Nonruptured Arteriovenous Malformations. Stroke 2014. 

Molina & Seilin. Unruptured Brain Arteriovenous Malformations: Keep Calm or Dance in a Minefield. Stroke 2014.

Dados do ARUBA trial em 2016. SLIDES AQUI. Resumo dos dados novos do estudo – AQUI.

 

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