Por Maramélia Miranda **
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A liberação…
A droga Aducanumabe foi aprovada ontem, 7 de junho de 2021, pelo Food and Drug Administration (órgão regulatório americano), para o tratamento da demência por Doença de Alzheimer. O medicamento será comercializado com o nome Aduhelm. A notícia, vinda após muitos anos sem nenhum lançamento de medicações específicas para a doença, causou polvorosa entre neurologistas, inúmeras notícias na imprensa e redes sociais, e mais ainda nos familiares dos portadores de Doença de Alzheimer.
Grupos de defesa dos pacientes nos Estados Unidos, e alguns poucos neurologistas, exaltam o Aduhelm como sendo uma nova opção para as pessoas com a doença de Alzheimer (DA). Entretanto, muitos outros neurologistas, e me incluo neste último grupo, avaliam que os resultados dos testes clínicos não são tão contundentes, e que são necessárias mais evidências para liberar o uso clínico da droga.
Que medicamento é esse?
O Aducanumabe é um anticorpo monoclonal que se liga seletivamente às fibrilas beta-amilóides. Em estudos de fase 2, a droga foi dada em doses mensais por via endovenosa a pacientes com transtorno cognitivo leve e demência em fase inicial, com resultados animadores em relação à redução expressiva de placas amilóides cerebrais, de forma dose dependente (maiores doses, maiores reduções).
Entretanto, estudos de fase 3 (ENGAGE e EMERGE) foram interrompidos pela empresa fabricante, a Biogen, justamente por análises interinas demonstrando futilidade, ou seja, não mostraram melhora clínica estatisticamente significativas. A história da molécula parecia estar realmente encerrada, quando, ao final do ano de 2019, a empresa fabricante da droga apresentou novos resultados e análises dos dois estudos que tinham sido negativos, tentando ressuscitar a história e reascendendo a polêmica: A droga é efetiva clinicamente?
Recepção entre os neurologistas
A comunidade internacional neurológica ainda é categórica: Há controvérsias a esse respeito… Os resultados mostrados nestas reanálises dos dois estudos de fase 3 foram marginais, e a relação custo-efetividade diante de resultados tão limítrofes é uma questão a ser considerada.
Nessa toada, a controvérsia fez com que o processo de aprovação pelo FDA levasse mais de 18 meses, entre idas e vindas, pareceres contrários, de comitê de neurologistas independentes, para, enfim, aprovar a medicação, aprovação avaliada com muitas críticas pela comunidade acadêmica…
A agência européia, EMA, ainda analisa o pedido similar naquele continente. O fato é que, independentemente dessas controvérsias, a farmacêutica Biogen conseguiu o que queria: emplacar a droga no mercado e colocar uma pitada de pimenta neste balaio de gato todo, que foi a confusão de estudos negativos, queda e ressurreição do aducanumabe no Alzheimer…
A Academia Brasileira de Neurologia, por meio de seu Departamento Científico de Neurologia Cognitiva e do Envelhecimento, já se manifestou oficialmente, orientando as indicações precisas, que são poucas, e a dúvida sobre a eficácia clínica da droga. A American Geriatrics Society foi mais além, e solicitou urgentemente que o FDA não aprove, ou seja, volte atrás na sua decisão de aprovar o aducanumabe para declínio cognitivo leve ou DA.
Para ciência de todos: o tratamento da Doença de Alzheimer com o novo Aduhelm terá um custo aproximado de 5000-6000 dólares por mês…
Será que valerá a pena?
Ciência ou Esperança? Em quem devemos depositar nossas fichas?
LINKS
Fillit & Green. Aducanumab and the FDA — where are we now? Nature Reviews Neurology 2021.
Carta da American Geriatrics Society.
** Dra. Maramélia Miranda é neurologista clínica e neurovascular, médica afiliada da Disciplina de Neurologia da UNIFESP / Escola Paulista de Medicina, e editora do site iNeuro.com.br.