Tomografia portátil na ambulância: Estudo negativo!

As ambulâncias com TC portátil, pensadas para o atendimento de vítimas de AVC, ao instituir rapidamente a terapia trombolítica, começaram a ser testadas na Alemanha em 2011. Depois, o grupo de Cleveland começou a estudar também esta solução, com a intenção de reduzir o tempo de início dos sintomas para a administração de rTPA em pacientes elegíveis para este tratamento. Apresentações de ambos os grupos, dos seus dados iniciais, feitas nos congressos, mostraram uma expressiva diminuição dos tempos porta agulha. A lógica é que isso poderia traduzir-se em melhor desfecho clínico aos pacientes…

Captura de Tela 2013-06-02 às 16.44.14

O grupo alemão, agora, publica os resultados a longo prazo do uso dos chamados veículos STEMO (Specialised CT-equipped mobile stroke treatment units).

O artigo, publicado na Lancet Neurology, mostrou que os desfechos clínicos em 3 meses após o AVC foi similar no grupo tratado com uso dos veículos STEMO, comparando-se a terapia convencional feita no hospital – detalhe – com os pacientes levados em sistema pré-hospitalar normal na cidade de Berlim, para a Universidade de Berlim (Charité Campus Benjamin Franklin). O desfecho primário medido foi Rankin modificado de 0 ou 1.

Resultados.

n=305 pacientes que usaram o STEMO; n= 353 no grupo de terapia normal. Não houve diferenças no desfecho primário medido: 53% dos casos que usaram STEMO vs 47% no grupo hospitalar tiveram mRS de 0 ou 1 (p=0,14).

Conclusão

Não houve diferenças… Que tristeza. Terá sido porque em Berlim eles trombolisam muito muito rápido os casos hospitalares? Por que será este achado???

Veja o que os autores escrevem no Abstract:

“We found no signifi cant diff erence between the proportion of patients with a mRS score of 1 or lower receiving STEMO care compared with conventional care. However, our results suggest that pre-hospital start of intravenous thrombolysis might lead to improved functional outcome in patients. This evidence requires substantiation in future large-scale trials. “

LINKS

Kunz et al. Functional outcomes of pre-hospital thrombolysis in a mobile stroke treatment unit compared with conventional care: an observational registry study. Lancet Neurology 2016.

Fechar ou não fechar FOPs em AVCi criptogênico: A saga nunca acaba…

O statement da Academia Americana de Neurologia, publicado há 6 dias, foi atualizado de sua anterior versão de 2004… Fala basicamente dos 3 grandes trials e que só devemos fechar FOPs nos pacientes com AVCi criptogênico se o paciente recorrer em vigência de terapia médica otimizada e regular… E quando indicar, a prótese usada deve ser AMPLATZER.

… E que não adianta anticoagular. A terapia de primeira linha é a velha e boa aspirina mesmo.

A revisão sistemática feita pelos chineses na revista Stroke também mostrou efeito similar da terapia médica versus endovascular… Veja o que os chineses concluem:

“The combined data from recent randomized controlled trials have shown no statistically significant differences between TDC and medical therapy in the prevention of recurrent ischemic stroke. The Amplatzer device closure showed a trend of protective effect in recurrent stroke compared with medical therapy, but this was associated with a significantly increased risk of atrial fibrillation. TDC closure was associated an increased risk of atrial fibrillation but not serious adverse events.”

Mâs…!!!!!!!!! (como dizem nossos amigos gaúchos… 😉

Nenhum dos artigos incluiu os dados de maior follow up do RESPECT… Gente… Tá demorando para publicar isso, eih?!?!?!

Não que eu seja muito fã de fechar tudo de FOP que vejo por aí, mas tem alguns casos em que você fica meio… Sem saída…!!!!!

LINKS

Messe et al. Practice advisory: Recurrent stroke with patent foramen ovale (update of practice parameter). Neurology 2016.

Li et al. Closure Versus Medical Therapy for Preventing Recurrent Stroke in Patients With Patent Foramen Ovale and a History of Cryptogenic Stroke or Transient Ischemic Attack. Stroke 2016. 

Miranda M. Fechamento de Forame Oval Patente: A volta triunfal do RESPECT Trial.

Angiopatia Amilóide Cerebral: Critérios e tratamento

Atenção. Doença difícil, difícil de manejo, difícil bater o martelo que é ela mesmo, clínica nem sempre tão clara, pois envolve, além dos sangramentos, que podem ser bem variados, também o declínio cognitivo, clínica de AITs ou de demência em boa parte dos casos, e até mesmo leucoencefalopatia simulando quadros inflamatórios.

Difícil manejo, principalmente quando há indicação de antiagregar ou anticoagular por outras causas… Enfim, é bom sempre revisar os conceitos e o que há de atual na sua terapia. Com a contribuição da Dra. Danyelle Sadala, que revisou o tema e nos apresentou hoje na reunião semanal do grupo, a seguir os pontos principais deste tema.

Para o tratamento, nunca esquecer: evitar antiagregantes ou anticoagulantes, controlar a pressão arterial, se possível evitar uso de estatinas, e em casos mais raros (encefalopatia ou leucoencefalopatia aguda), considerar imunossupressão.

Ou seja, você não pode dar nada na maior parte dos casos, apenas sentar ou ajoelhar, e rezar…

Critérios de Boston para o diagnóstico de Hemorragia Cerebral relacionada a AAC. <<< PDF aqui.

Criterios-Boston-Angiopatia-amiloide

LINKS

Fotiadis et al. Cortical atrophy in patients with cerebral amyloid angiopathy: a case-control study. Lancet Neurology 2016.

Arima et al.Effects of Perindopril-Based Lowering of Blood Pressure on Intracerebral Hemorrhage Related to Amyloid Angiopathy.The PROGRESS Trial. Stroke 2010.

Knudsen et al. Clinical diagnosis of cerebral amyloid angiopathy: Validation of the Boston Criteria. Neurology 2001.

Greenberg et al. Amyloid Angiopathy–Related Vascular Cognitive Impairment. Stroke 2004.

Samarasekera et al. The association between cerebral amyloid angiopathy and intracerebral haemorrhage: systematic review and meta-analysis. JNNP 2012.

Boyle et al. Cerebral amyloid angiopathy and cognitive outcomes in community-based older persons. Neurology 2015.

Menos ou mais de 140mmHg no AVCh??? Eis a questão…

ATACH-2 publicado.

Foi apresentado no congresso europeu em Barcelona no mês passado. Resultado negativo.

Agora (anteontem) – detalhes do paper, publicados na NEJM.

O que era já algo controverso, agora piorou. O INTERACT-2 nos mostrou que baixar agressivamente a PAS para menos de 140mmHg em AVCh, nas primeiras horas do icto, foi seguro, mas deixou dúvidas quanto ao benéficio clínico para os pacientes.

Verdade mesmo era que muita gente da comunidade não engoliu bem os resultados do INTERACT-2… Vero.

Um p na trave, umas explicações estatísticas duvidosas, mas fazer o que?! Na prática, e numa doença grave destas, onde não temos quase nada a fazer?!?!? Só nos restava ligar o nitro e mandar ver! Meio que… Tentando reduzir expansão do hematoma, mesmo sabendo que isso não teve muita tradução em desfechos clínicos. Este é meu pensamento… E o de muitos!

Agora, Adnan Qureshi e sua turma aparecem com um balde de água fria pros amantes da redução agressiva da PA…

ATACH-2 negativo, interrompido por futilidade. CLEAR-3 negativo. Como vemos, a coisa não anda nada boa pro coitadinho do AVCh. Nada dá certo!?

AVCH-expansao

Baixar ou não baixar agressivamente a PA na fase aguda do AVCh? Voltamos à estaca zero no tratamento do AVCh?

LINKS

Silver & Anderson. Review of the systolic blood pressure intervention trial for hypertension management. How low to go for patients with stroke? Stroke 2016. Na Stroke de Junho de 2016.

Anderson et al; INTERACT2 Investigators. Rapid blood-pressure lowering in patients with acute intracerebral hemorrhage. NEJM 2013.

Qureshi et al. Intensive Blood-Pressure Lowering in Patients with Acute Cerebral Hemorrhage. NEJM 2016.

Guideline para reabilitação em AVC – 2016

O mundo ideal não é igual em qualquer lugar.

A reabilitação nos EUA pode parecer um sonho, modelos de reabilitação intensiva intrahospitalar, nursing homes, rehab hospitals, altas de hospitais gerais para hospitais de reabilitação… Essas coisas que sempre sonhamos mas não temos nem um tiquinho aqui no Brasil…

Introduzindo assim, explico que esta diretriz realmente… Não pode ser aplicada para nossa realidade como um todo! 

Pra começar, a importância do artigo é grande. É a primeira diretriz em reabilitação no AVC da AHA (American Heart Association) e ASA (American Stroke Association). Demorou, eih?!

Quando forem ler, podem até pular a parte que fala das recomendações de terapia de reabilitação intensiva na fase aguda… Dos modelos tal e qual eles tem lá, e nós… pobres brasileiros mortais, não temos… 🙁

Li aquilo e pensei: Doce ilusão para nós, brasucas! Não sonhe, Maramélia. Conto nos dedos onde temos um time de reabilitação estruturado e organizado assim no Brasil. Joinville (S. José), Sarah, Lucy Montoro, alguns centros privados. Mais algum????

Voltando ao mundo real, vi que alguns itens das recomendações são bastante importantes, como, por exemplo, a referência de que mobilização precoce nas primeiras horas do AVC é deletério (resultado do estudo publicado no ano passado, não lembro o nome dele, daqui a pouco resgato e modifico…)… As recomendações de manejo nos membros paréticos, muito interessantes… Principalmente aos nossos pacientes ralam bastante para ter acesso aos serviços de Fisiatria e Reabilitação no nosso país.

Há recomendações específicas para manejar e tratar ombro doloroso! Isso é uma glória! Não vou ter que ler e estudar os papers todos para pegar as melhores dicas de tratamento… Está tudo lá, resumido.

Quantas vezes você mandou o paciente com AVC para passar com Fisiatra por causa disso e ele voltou sem conseguir a consulta??? Eu? Váaaaarias.

Há recomendações do manejo de distúrbios esfincterianos, negligência, apraxia, transtorno cognitivo, ataxia, disartria, afasia, etc… Bem completo o guideline… Mencionam uso de drogas para memória e fala, como donepezila, rivastigmina, fluoxetina para melhora motora, e reforçam a ação deletéria do metilfenidato e moldafinila, importante alerta aos que gostam de usar estes agentes nos casos com extrema apatia — atenção, galera::: ritalina, não.

Enfim, uma boa pedida para leitura.

LINKS

Winstein et al. Guidelines for Adult Stroke Rehabilitation and Recovery. A Guideline for Healthcare Professionals From the American Heart Association/American Stroke Association. Stroke 2016.

Escore ICH no Hematoma Intraparenquimatoso

Simples, fácil de fazer.

E pra que serve? Mais uma escala burra para decorar? Mais um indicador fútil para registrar?

Naaaãoooooooooo!!!!!!!

ICH escore-Lembrança-NICU

Quando tiver diante de um paciente com AVCh hipertensivo, por exemplo, o subtipo mais frequente de hemorragia intracerebral, muitas famílias irão te perguntar:

“E qual é o prognóstico, doutor?!”

Esta escalinha, chamada de escore ICH (intracranial hemorrhage), ou ICH score, que já foi validada em vários centros diferentes da escala publicada originalmente por Hemphill e colaboradores, realmente funciona.

De acordo com a pontuação, há uma estimativa da de mortalidade em 30 dias…

Pra calcular o volume do hematoma em ml, tem que usar a regrinha ABC/2 na tomografia de crânio. Daqui a pouco posto aqui como é fácil.

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Hemphill et al. The ICH Score. A Simple, Reliable Grading Scale for Intracerebral Hemorrhage. Stroke 2001.

Estudo ARUBA: Não tratar MAVs assintomáticas com intervenções

Por Maramélia Miranda

Os dados de maior follow-up do estudo ARUBA – A Randomized Trial of Unruptured Brain Arteriovenous Malformations, único estudo clínico prospectivo controlado até o momento a se estudar qual o melhor tratamento para MAVs assintomáticas, foram apresentados no ISC 2016, em Los Angeles, esta semana.

Estes dados merecem um destaque pois, semelhante à sua primeira publicação (2014, Lancet), os pesquisadores confirmaram que realmente, intervir em casos assintomáticos aumenta em muito o risco de AVC, morte e novos déficits neurológicos.

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Os slides da apresentação estão disponíveis para quem quiser ver (abaixo).

E VEJAM.

São números realmente convincentes. A controvérsia com a Neurocirurgia e Neurorradio Intervencionista continuará… A redução de risco de AVC com o tratamento médico é de impressionantes 78%… !!!!!!

Number Needed do HARM – 5 !!!!!!

Aumento de risco de morte e AVC – 4,5 x mais !!! Com grande predomínio de eventos de AVC.

Aumento de risco de novos déficits funcionais – 2,5 x mais !!!

Comentários

O ARUBA foi um estudo que teve financiamento público, do NINDS, agência de fomento de pesquisas americana. Não há, a meu ver, conflitos de interesse por nenhum tipo de tratamento que envolva procedimentos, próteses, materiais ou reservas de mercado de um ou outro especialista. O resultado do estudo, até o momento, foi a favor de tratamento clínico (expectante). Ou seja, é melhor não fazer nada com estes casos, e apenas acompanhar…

Vários centros de neurocirurgia vascular demonstraram e ainda alardeiam por aí severas críticas ao ARUBA, mas a verdade é uma só. Esta é a evidência científica mais forte, maus robusta, sobre qual é a terapia de primeira linha a ser escolhida, de uma forma geral, inicial, para as MAVs assintomáticas (que nunca sangraram)… Respeitadas particularidades de cada caso.

A partir destes novos dados, fica cada vez mais claro que em MAVs assintomáticas, a recomendação é seguimento clínico sem intervenções. E intervenções, sejam elas embolizar, radiocirurgia ou neurocirurgias, deverão ser feitas, a princípio, dentro de protocolos de pesquisa. Assim funciona a Medicina Baseada em Evidências. Não é achismo, anedotismo ou “eu faço, eu garanto, eu assumo”.

É buscar uma estimativa de melhor terapia médica, com base em estudos clínicos e estatística, para tentar aproximar o quanto podemos uma ciência que não é exata, a Medicina, em dados um pouco mais precisos…

Resta aos neurocirurgiões desenharem, fazerem, executarem, e logo!!! – um estudo clínico prospectivo, testando a hipótese que vários expertises em Neurocirurgia Vascular, em MAVs, conseguiram demonstrar / replicar, em séries de registro e estudos retrospectivos: de que as MAVs assintomáticas dos tipos I e II devem ser tratadas exclusivamente com Neurocirurgia.

Que venha o estudo BARBADOS!!!

LINKS

Mohr et al. Medical management with or without interventional therapy for unruptured brain arteriovenous malformations (ARUBA): a multicentre, non-blinded, randomised trial. Lancet 2014. Estudo publicado em 2014.

Mohr JP et al. Viewpoints on the ARUBA Trial. AJNR 2014. Opinião e discussão dos autores do estudo sobre o mesmo e sobre as críticas dos neurocirurgiões.

Hanjani S. ARUBA Results Are Not Applicable to All Patients With Arteriovenous Malformation. Stroke 2014. 

Mohr JP. Results of ARUBA Are Applicable to Most Patients With Nonruptured Arteriovenous Malformations. Stroke 2014. 

Molina & Seilin. Unruptured Brain Arteriovenous Malformations: Keep Calm or Dance in a Minefield. Stroke 2014.

Dados do ARUBA trial em 2016. SLIDES AQUI. Resumo dos dados novos do estudo – AQUI.

 

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Plasma Fresco vs Concentrado Protrombínico em hemorragia intracraniana: Adivinha quem ganha?

Esse estudo é covardia… Assim não vale. Não pode ser… 🙂

Colocar o concentrado de complexo protrombínico (CCP) pra brigar com o coitadinho do plasma fresco congelado (PFC)… Em casos de AVC hemorrágico por distúrbio de coagulação…

Coidadinho do PFC…

Agora falando sério.

Realmente, não havia estudo controlado. Os alemães, que de bobos não tem nada, resolveram fazer.

E, óbvio, foi positivo.

Steiner T et al. Randomized Trial on Normalization of International Normalized Ratio Using Prothrombin Complex or Fresh Frozen Plasma in Vitamin-k Related Intracranial Bleeding. ISC 2016. Resumo da ópera em um slide AQUI.